O ontem, a velha e a lua
- Tatiana Navega
- 18 de ago. de 2021
- 1 min de leitura
O ontem, velha carregadora de sementes, enrugada e de olhar distante de quem não pertence a lugar nenhum, vem a passos lentos, como água de mar invadindo pouco a pouco o terreno que a gente secou.
A velha-ontem puxa, sem medo, a cadeira que sustenta a importância que a gente se dá, fazendo-nos cair no chão, para poder sentar. Olhamos para ela contrariados, porém, mais antiga que a raiva ignorante que nos permitimos sentir, ela nos vê como crianças que ainda tem muito por aprender.
Lenta e despreocupada, ela procura algo em sua cumprida sacola, deixando-nos irritados pela demora inerente ao ato de encontrar uma solução. Ela sorri.
A velha-ontem abre um livro e estende em nossa direção. Um vento frio faz da nossa espinha escada para poder subir. Na página amarelada está do desenho do rosto de cada um de nós:
- Esse é o livro da vida, ela diz. Como um quebra-cabeça humano, você é formado pelo encontro de cada um dos seus ancestrais.
Instintivamente olhamos para trás, todos eles estão ali, de mãos estendidas, oferecendo os pedaços que hoje nos permitem existir. Ela balança a cabeça e explica que quem não compreende o passado, não sabe lidar com aquilo que carrega e por isso se atrapalha na hora de viver.
Ela aponta para o céu. Diz que logo tampará o Sol para que a gente possa ver o que se esconde na escuridão. Nos despedimos, abençoados, afinal, não é todo dia que a lua vem nos visitar.
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